quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Reforma da Administração Local

O Documento Verde da Reforma da Administração Local (RAL) pode ser consultado aqui.
Quanto ao tema em questão, a RAL, pretendo começar por apresentar alguma informação relevante para a análise do processo relativamente ao nosso concelho.
Os municípios e freguesias serão categorizados de acordo com critérios demográficos e geográficos, numa primeira fase. As categorias podem ser observadas na tabela 1 e na figura 1

Tabela 1: Categorias de Municípios segundo Documento Verde da RAL

 Figura 1: Categorias de Municípios segundo Documento Verde da RAL

O Documento Verde da RAL define 3 tipologias de freguesias: Áreas Predominantemente Urbanas (APU), Áreas Medianamente Urbanas (AMU) e Áreas Predominantemente Rurais (APR). Os critérios subjacentes a esta classificação podem ser encontrados aqui.

 A informação acima apresentada ajuda a contextualizar a opinião aqui explanada.

Agora, quanto ao Documento Verde da RAL em si.
Antes de mais, o Documento assume a vontade de melhor servir as populações através da RAL, tal como salienta a necessidade de flexibilizar os parâmetros de acordo com a realidade de cada concelho, ou seja, os marcoenses devem ser parte integrante deste processo já que podem ter um papel activo na definição de critérios ou na valorização de parâmetros.
Existem alguns aspectos positivos a reter neste documento, que passo a enumerar:

1. Maior exigência autárquica: Este é um aspecto que, sendo à partida positivo, pode ser uma enorme fonte de problemas para os marcoenses, uma vez que esta RAL permite uma maior responsabilização dos autarcas, a diferentes níveis. Esta redefinição administrativa obrigará a uma maior dedicação temporária por parte dos autarcas, no sentido de acorrerem a uma maior população. Este aspecto pode conferir uma maior operância às juntas de freguesia, contudo deve também exigir uma "semi-profissionalização" dos presidentes de junta, isto é, haverá maior responsabilidade, haverão mais necessidades e serão conferidas mais incumbências às juntas de freguesia, pelo que é desejável (porque não obrigatório) que os autarcas detenham mais conhecimento técnico/empírico para desempenhar as suas funções.

2. Maior equilíbrio administrativo: a actualização das freguesias de acordo com parâmetros rigorosamente definidos permite, em última análise, um melhor serviço público, dado que se verifica uma reorganização administrativa de acordo com o contexto actual e não dirigida para tempos passados. Efectivamente, pode advir da RAL um maior equilíbrio dos serviços públicos prestados, assim como uma racionalização de meios e recursos (aqui devemos ser exigentes!!). Por fim, é de salientar a importância da aglomeração de freguesias, processo que pode potenciar uma maior coesão territorial assim como o aparecimento de economias de escala (exemplo: quantos presidentes de junta não concordarão com a afirmação de que "as maiores freguesias conseguem mais obras" junto das câmaras, isto porque estas têm maior número de votantes, a RAL permite um maior equilíbrio neste aspecto).

Como aspectos negativos há, numa perspectiva pessoal, a enumerar:

1. Desvalorização de necessidade de Regionalização: Este processo é preponderante para o país e mais ainda para a região Norte. A macrocefalia lisboeta desvirtua as restantes regiões do país, esquecendo o potencial que aí reside (bem superior ao potencial lisboeta) e deixando este a pensar em função de Lisboa. O Documento Verde da RAL deixa esta questão completamente fora da mesa.

2. Falta de coragem para cimentar as CIM: As Comunidades Intermunicipais (CIM ou AM - Áreas Metropolitanas nos casos de Porto e Lisboa) são comummente apelidadas de "semi-regionalização" (mas isso é para outra altura) e ainda uma balela criada para absorver fundos estruturais europeus (Lisboa beneficia enormemente da falta de legitimidade das CIM e da ausência de Regionalização - os interesses limitam a evolução do país). Não obstante isto, as CIM poderiam ser um REAL ponto de convergência entre municípios permitindo uma maior captação de investimento, a delineação de estratégias integradas e a potenciação da região. A RAL seria o momento ideal para tornar estas estruturas legítimas, concretizar, desde já, algo que vai ser feito, mesmo que em sentido contrário à vontade da população, no longo prazo. As CIM constituir um potente motor de desenvolvimento regional. O Documento Verde da RAL ignora tudo isto.

3. Argumento económico é falso: Com maiores incumbências conferidas a juntas de freguesias e em câmara municipais advêm, obviamente, maiores custos. Tal como a exigência de maior tempo aos autarcas irá obrigar à dedicação a tempo inteiro ao cargo, exigindo com isso maiores custos. Ainda com esta maior incumbência de responsabilidades ao poder local advém a necessidade mais meios de trabalho. Resultado: Mais custos. Em cima de tudo isto, o Secretário de Estado responsável pela RAL admitiu que os valores transferidos para o poder local vão manter-se, serão apenas distribuídos por menos freguesias (mas, na realidade, pela mesma população). No aspecto económico é ainda de salientar que, mesmo que a poupança fosse verdadeira, esta seria residual, uma vez que as transferências para as freguesias absorvem apenas cerca de 4,5% do orçamento municipal (no caso do Marco de Canaveses, meu concelho de origem) e esta percentagem inclui já financiamento da actividade escolar nas freguesias, pelo que seria desprezável o efeito de poupança.

4. Municípios escapam: Não sendo conhecedor das diversas realidades por esse país fora, a verdade é que existem municípios cuja população é muito reduzida e, a meu ver, não justificam a necessidade da existência de uma câmara municipal. Claro está que este argumento é redutor, e não querendo falar dos municípios alentejanos (um caso diferente), basta referir municípios como Melgaço (cerca de 9000 habitantes), Caminha (cerca de 16500 habitantes) ou os municípios das Terras de Bastos (juntos - Celorico, Cabeceiras e Mondim - totalizam cerca de 46000 habitantes) que poderiam ser alvo de agregação a outros municípios. Aqui é demasiado evidente o LOBBY da Associação Nacional Municípios Portugueses (ANMP) e do seu presidente Fernando Ruas (forte apoiante de PPC).

Muitas mais considerações poderiam ser tecidas (e irão ser) acerca desta RAL, no entanto outros contributos se irão juntar a este e seria desinteressante repetir conteúdos. Quero apenas fechar com 3 notas:
1. Para a importância do envolvimento das populações, através de debates ou conferências pelo concelho fora, escutando as opiniões dos cidadãos assim como de entidades e colectividades;
2. Para a necessidade de ponderação desta RAL e dos seus efeitos, não sendo aconselhável fazê-la de forma apressada e, por conseguinte, errada;
3. Para a necessidade de visão a longo prazo, tendo em linha de conta que esta RAL deve ser válida e actual num prazo alargado de tempo, pensando, com isso, já em casos que, sendo desagradável abordar agora, é indispensável fazê-lo, sob pena de estarmos a refazer todo este processo bem mais cedo que o desejado.