terça-feira, 9 de outubro de 2012

Nuno Grande


Ontem morreu o Dr. Nuno Grande, amanhã será o seu funeral.


Se calhar muitos jovens alunos do ICBAS só o conhecem de uma aula de Neuroanatomia. Mas o Nuno Grande é o ICBAS, todo o ambiente que subjaz nesta faculdade deve muito à entrega, à dedicação, à ideologia deste Homem, que quem o conhecia bem o descreve como uma pessoa ímpar! 

Infelizmente eu sou um daqueles que só o conhece através dessa aula e que o conhece através da atmosfera que sempre esteve presente, principalmente nas paredes do 'velho' ICBAS. Por isso deixo-vos com alguns testemunhos de pessoas que o conhecerem melhor que eu, tentando, desta forma, perpetuar o trabalho e a ideologia de uma vida.

Júlio Machado Vaz:

"Mestre e Amigo.

Partiu Nuno Grande. 
Lembro ralhetes carinhosos pelos corredores do ICBAS - "você nunca me fez a vontade...". Com efeito, amei o Ensino em abstracto e os alunos em particular, mas a Cátedra não me atraiu. Ele teve caminho atribulado a caminho da sua, vejo-o a preparar uma Lição - e nunca a palavra se justificou tanto... - em casa de meus Pais, sem me aperceber do que o seu brilho
 faria das notas breves, tomadas em amena cavaqueira. E o Anfiteatro rendeu-lhe a primeira homenagem ouvindo-o num silêncio religioso, para depois rebentar numa salva de palmas entusiástica, quem decretou a Medicina alheia à Cultura? A política universitária é conservadora, todos sabíamos que não ficaria à frente de outro distinto professor, Pinto Machado, a quem devo amizade e paciência evangélica no exame de Anatomia, até o cadáver tinha os nervos em franja..., perante o triste espectáculo dos meus:). Portanto, no que ao mérito relativo dizia respeito, estávamos conversados. Mas, para enorme surpresa indignada, houve votos contra em mérito absoluto. Cheguei a casa e explodi à mesa, o meu querido Velho sorriu com amargura e disparou - "aquele aplauso não ajudou nada...". Ah, as delícias do voto secreto, permite abraçar o candidato que há minutos, com mesquinhez, se maltratou! Momentos e gente houve que, a posteriori, me fazem abastardar o título do programa dos Gatos - "Dizem que é uma espécie de Universidade:(."
Professor Nuno - dê um abraço ao Pai e guarde outro para si. Apertado e grato.."


José Mariano Gago:

"Mas posso testemunhar o papel singular de Nuno Grande, médico e universitário empenhado em apoiar com todas as suas forças o desenvolvimento científico do País. Recordo a presença activa e constante pelo menos desde as Jornadas Nacionais de Ciência e Tecnologia de 1987 e a coragem com que deu a cara em muitos momentos difíceis desde então.

A persistência para a melhoria dos cuidados de saúde, do ensino médico e da investigação, associada à pulsão da intervenção cívica, tornaram-no uma figura singular na sua cidade e no País, e contribuíram, pelo exemplo, para enraizar na sociedade a ideia de que a ciência, toda a ciência, age em nome do bem comum, é indissociável da democracia, da justiça social, da liberdade, e que sem desenvolvimento científico não há futuro."


Bruno Maia:

"Para quem passou 6 dos mais importantes anos da sua curta vida no velho edifício das “Biomédicas”, Nuno Grande não é um ídolo, não é um ícone e não é mito! Nuno Grande é o nome que ecoa nas paredes e nos recantos do edifício e das almas que por ele passaram – quer dizer conhecimento, quer dizer dedicação, quer dizer democracia, quer dizer diversidade do saber, quer dizer partilha e solidariedade no trabalho, na ciência, nas instituições e na sociedade em geral.
Estive na última aula do Professor Nuno Grande antes da sua jubilação – foi-nos falar do nervo facial e de como, sentado no seu sofá, se auto-diagnosticou com um tumor que comprimia aquele nervo e sozinho, sem contar à família, foi ao Hospital de Santo António para ser operado de imediato. Era assim, um Homem que conta uma história simples, que olha a vida com senso, procurando ao máximo a verdade nas coisas, ou melhor, procurando a melhor das verdades pois ele sabia perfeitamente que não há só uma. E mesmo com todo o senso do mundo e o mais racional dos discursos, adivinhava-se facilmente que os olhos brilhavam de entusiasmo tanto quando falava de um nervo craniano como quando falava do perigo da ameaça nuclear."


Fica aqui também um link com um documentário que aconselho a toda a gente, mas especialmente, aos novos alunos de Biomédicas! 
Pedro von Hafe Leite