sábado, 14 de abril de 2012

De hoje para a amanhã e depois, é preciso mais e melhor

Por mais que uma vez escrevi sobre dois temas que entendo estarem muito ligados ao nosso quadro de marasmo. Estas ideias são a falta de reformas fundamentadas num perspectiva integral e a falta de um zeitgeist motivador.


1. A cobardia e porque nunca existiram verdadeiras reformas
Claramente que este governo há semelhança de muitos outros governos não abdica do lugar que detém dentro de um poder político altamente centralizado e controlador, seja por ganhos que tem na manutenção de um sistema que garante o status e os interesses de muitas classes profissionais dos quais muitas vezes são directamente afiliados ou interessados ou por simples cobardia de enfrentar tamanhos interesses. A objecção reside no facto de que a premissa fundamental, de muitas destas reformas que devem ocorrer em Portugal no plano institucional, é a descentralização de competências e responsabilidades, logo muita gente ficaria sem o seu couto do orçamento estatal em Lisboa.


Vejam o exemplo da reforma administrativa, alvo uma pseudo discussão/negociação que acabou há pouco tempo e que de modo peremptório foi completamente afastada, em muito pelo desconforto gerado dentro do PSD, um sinal claro que este governo e partido é o mesmo de sempre igual a si e ao PS. A questão fundamental desta temática ou seja as autarquias e o reguebofe que representam nas contas do Estado eclipsou-se.
O país evolui económica e socialmente e nada mudou na organização administrativa e na distribuição do poder local. Reorganizar freguesias é uma pequena questão que quase nada muda, basta verem qual os poderes, orçamentos e respectivo peso no orçamento estatal das juntas. Talvez se possa argumentar que num país propício à inércia e ao atrito a reformas temos que começar por pequenos passos mas não vejo nada que possa substancialmente fundamentar uma reforma autárquica. Mais uma vez um governo tenta enfrentar um touro demasiado bravo para os seus intentos e saí com o rabo entre as pernas.


2. Oportunidades históricas que nos escapam e sairão caro
Desta forma, a cobardia juntamente com falhas de comunicações, mentiras evidentes e com manipulações tornam este governo mais fraco. Vai-se queimando logo agora que nos começamos a perceber que fazer tudo o que a troika impõe e não pensarmos por nós próprios pode levar um resultado bastante próximo do da Grécia. Basta ver os números da economia em especial os de desemprego e rapidamente nos apercebemos que não podemos esperar pelo milagre das exportações quando os nossos principais mercados entram em contracção. Esta crise podia ser realmente uma oportunidade de poder sair de um paradigma conformado e demasiado viciado mas todos os agentes sociais e económicos demonstram aquilo que já sabíamos; somos uma sociedade vazia em valores e em ideias para o futuro. 


3. É preciso chamar a Europa
Para além disto, num momento decisivo para concertar estratégias a longo prazo, em especial dentro do plano europeu para a estabilização e para o crescimento da economia, estamos irremediavelmente sozinhos na Europa. Pouco ou nada parecer ser feito para haja uma união efectiva na Europa, para baixar taxas de juros antes que fiquemos arreados ou seja antes que haja tamanha destruição da capacidade financeira e produtiva do país que fiquemos sem massa crítica. A somar isto temos que pensar que existem pressupostos ao nosso regime e ao nosso estilo de vida que tomamos como garantidos que podem começar a falir. Basta pensar que cada ano que estamos em recessão ficamos atrasados no mínimos dois anos, preciosos para reparar problemas a longo prazo como a nossa crise demográfica. Problemas do tecido social que não só nossos mas de muitos outros países europeus. Este era o momento fundamental de liderança.


Para isso era preciso coragem para fazer aquilo que resta para além das eurobonds, ou seja as soluções do meio da ponte no plano institucional. Estas soluções são por exemplo: baixar taxas de juro dando tempo aos bancos para se desalavancarem, financiar a economia e para baixar a pressão do euro dando um empurrão para as exportações extra-comunitárias que a longo prazo parece ser o único passo que a Europa pode tomar.


4. Talvez pedir seja demais, mas agora contento-me por sinceridade e igualdade
Precisamos de mais do que mera gestão, precisamos de genuína liderança e de exemplos daqueles que tem efectivas responsabilidades. Exemplos na coragem com que enfrentam as adversidades dos interesses instalados e na sinceridade e honestidade com que tratam o seu povo com lealdade e como iguais que não temem.


5. Pequenos passos, são pouco nesta altura mas são bem-vindos
Alguns pequenos passos podem motivar um povo que começa a desistir do futuro e da esperança. Estes pequenos passos não custam dinheiro e falam claramente sobre a justiça e a esperança de um melhor amanhã. Falo desde a justiça em si mesma, para obter um regime judicial eficaz que não atrase a iniciativa privada, que devolva a quem de direito em tempo útil mas também no plano da governação que enfrente os interesses das grandes empresas como as energéticas e diminua as avultadas rendas a estas e outras inúmeras empresas que prestam serviços públicos a preços ridiculamente altos e desproporcionados.




Paulo Coelho